quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Um dia de Hexacampeão



Domingo, dia 06/12/2009. São 9:40. O despertador do celular toca. Levanto, ainda sonolento. Um gostinho de sapato velho na boca, devido a uma pequena ressaca. Na véspera rolou festa de aniversário da minha amiga mais antiga.

Hoje é o dia que o Flamengo VAI ser hexa. Acordei com esse pensamento. Última rodada do Campeonato Brasileiro de Futebol. A partir das 17:00 o Flamengo precisava “apenas” ganhar do Grêmio. E não dependia de mais nada para ser campeão. A longa semana de espera finalmente acabou.

Estava na Ilha do Governador, no AP da minha namorada. O Sereno havia sido o campeão do mês do Cartola e tinha marcado bar do campeão 12:00 no Maracanã. Conversei um pouco com minha namorada, ainda com sono. Pedi pra que ela fizesse um pão na chapa enquanto iria me arrumar. Tomei um banho de água gelada pra já ir curando a ressaca. A todo momento pensava como seria o jogo. Não tirava o Flamengo da cabeça. As musiquinhas, os cantos do estádio, o hino, ecoavam na cabeça a todo instante. Tomei o café. Vimos algum seriado que passava na NET. Me despedi dela, peguei o carro. Fui em direção ao Maracanã.

Acho que eram 11:20, aproximadamente. Estrada do Galeão, Linha Vermelha. Já no caminho passei por alguns carros com bandeiras vermelho-e-pretas e vans com Flamenguistas. As buzinas se cumprimentavam e todos gritavam “MENGOOO”.

Por volta de 11:30 chego na Praça da Bandeira. Tudo engarrafado! Pensei: “Não é possível, não deu nem meio-dia!”. Sim, tinha muito torcedor chegando, mas na verdade era uma obra que tava rolando ali também.

Cortei o caminho. Passei perto da ETFQ e tinham vagas pra estacionar e fiquei mais aliviado. Queria parar o carro na Paula Sousa, já que iria dormir no estratégico apto do Gabriel, pois com certeza absoluta não conseguiria voltar dirigindo para casa.

Chegando no posto do lado do CEFET já havia muito movimento. Mas quando entrei na General Canabarro, tudo mudou. O bar do Chico já estava LOTADO! Lotado do tipo, não tem mais um lugar e todo mundo em pé na rua, que praticamente já estava fechada pelos torcedores por ali.

Mas consegui passar, virei na esquina e achei uma vaguinha me esperando. Se eu chego 1h depois, com certeza não acharia vaga alguma. Desci do carro, já liguei pra Angela, a qual acordei: “Acorda, porra! Já to com a latinha de cerveja na mão”. Eram 11:48.

Virando na esquina, ali estava ele, majestoso como sempre: o Maracanã. O sentimento ficou mais forte, muita gente já nas intermediações. Atravessei a rua e subi para o apto do Gabriel. Sereno já estava lá, seco e tenso por uma cerva, assim como eu. Eu tinha ingresso para cadeira, assim como meu irmão que ainda estava vindo de Niterói. O Sereno tinha arquibancada. E só. Todo o resto da galera não conseguiu ingresso ou não quis pagar os preços exorbitantes que os cambistas cobraram durante a semana.

Depois de umas conversas e ver no Youtube o vídeo com a montagem do Hitler zuando os bambis, descemos eu, Gabriel e Sereno e fomos pro Delta, ali na esquina. O posto do lado já estava lotado e o Delta mais ainda. Levei quase 10min pra pegar 2 cervejas. Sentamos. Pronto. Começou. A galera do bar já cantava as músicas.

Era impressionante: 95% das pessoas que passaram usavam a camisa do mengão. Um clima de festa, alegria já começava ali. Depois chegaram Vidal, Marcelo, Filipe, Paty (botafoguense), Angela, Zanette e um parceiro do mesmo. Chegaram também Fábio Fundo e Rômulo (botafoguense).

Filipe levou um heróizinho do McLanche Feliz, azul. Olhei pra ele e pensei: “Grêmio, azul. Vou levar esse bonequinho e fazer um vudu”.

É, eu sei, coisa de maluco. Mas são coisas do futebol.

Ficamos bebendo e 14:00 Vidal e Marcelo já foram pro estádio. Gabriel e Angela estavam na pilha de tentar arrumar um ingresso lá na porta, depois do jogo começando. Até que um amigo do Zanette apareceu com 3 ingressos de cadeira. O Sereno trocou a arquibancada dele por 2 cadeiras e o outro foi vendido por 100 reais. Eu havia pago 125, então foi ótimo negócio! Assim sendo, faltava apenas ingresso pra Angela, pois esse último tinha ficado pra Hélvia.

Continuamos bebendo... deu 14:30, a cerveja acabou. Sereno e Gabriel me ligaram da fila da arquibancada (onde foram trocar os ingressos com o amigo do Zanette) e falaram pra ir entrar logo que a fila tava tensa.

Fui junto com a Angela. Fábio Fundo peidou. Realmente, a arquibancada tava com a maior fila que eu já vi para entrar. Ia do Bellini até a entrada da cadeira!

Já a cadeira tava mais tranquila. Pelo menos pareceia. Nesse ponto, Gabriel, Sereno e Hélvia já tinham entrado. Rodei um tempo com a Angela pra tentar achar ingresso, mas não deu em nada. Meu irmão também já tinha entrado, então nos separamos e fui entrar. Furei a fila mesmo. Estava tudo uma bagunça. Cheguei na frente, parecia entrada do Rock n Rio. Por sorte, foi só confusão e empurra-empurra. Mas na entrada, não estavam passando o ingresso na roleta, apenas recolhendo. Na mesma hora liguei pra Angela “Arruma qualquer ingresso, até falso e vem que dá pra entrar!”.

Lá dentro, Maracanã já cheio. O vermelho e preto tomava conta do ambiente. Lindo, lindo, lindo demais. A torcida estava linda. Clima de final. Clima de que hoje era o dia de gritar, gritar e gritar “É campeão”.

Encontrei meu irmão e depois fomos nos encontrar com o Gabriel. Chegando lá, eles tensos. Sereno e Hélvia quase foram pisoteados na entrada devido a extrema confusão. Gabriel perdeu o chinelo e a Hélvia o tênis. Mas entre mortos e feridos, estava tudo certo.

Na confusão, um ingresso acabou sobrando na mão do Gabriel, assim ele sugeriu passar pra Angela. Isso era por volta de umas 15:20.

Voltei pra entrada das cadeiras pra esperar a Angela e o clima era BIZARRO. Polícia tentando fechar os portões e as pessoas de fora tentando abrir. A galera mais atrás da fila empurrava, forçando. Na pequena fresta, alguns passavam debaixo de muita porrada. Esperei 25min e nada. Angela me liga dizendo que tava perto, mas teve que voltar pois a polícia tava descendo o cacete na galera que tava mais pra frente. Ouvi alguns policiais falarem que não iam abrir o portão e desisti. Voltei pro lugar onde estávamos.

Ficamos ali onde fica a torcida do vasco. Pertinho do gol, um pouco mais pro meio campo, do lado do banco de reservas.

Tique-taque. Maracanã LOTADO. Eram 16:54, Angela me liga:

- Ainda tá aí?

- Po cara, voltei pra cá, a polícia não vai abrir!

- Po, mas agora tá andando tranquilo.

- Então guenta aí que vou levar o ingresso pra tu.

Fui saindo e Gabriel: “Vai perder a entrada do time??”. Mas eu já ia voltar. A festa que eu queria ver era outra.

Fui, a fila realmente havia mudado. A cavalaria estava por ali, parece que resolveram o problema. Angela entrou, fomos correndo pros nossos lugares. A torcida já estava louca, insana. Cantando todas as músicas possíveis. Os times já em campo se preparando.

Juiz apita, jogo começa. E é nesse momento que parece que apertam um botão de adrenalina na gente. Tensão total. Com apenas 5s de jogo eu já pensava “esse gol não sai, porra!”.

Bola daqui, bola dali. Torcida grita, torcida para. Tensão total. Escanteio pro Grêmio. Gol no primeiro pau. RIDÍCULO. E bem na nossa frente.

Curiosamente, não fiquei tão tenso. Sei lá, alguma coisa me dizia que seria campeão. Mas a galera em volta não pensava assim. Gabriel se abaixou e acho q começou a rezar, não sei. Notava-se um claro medo de uma nova tragédia, ocorrida um ano antes.

Jogo tenso, galera gritando “VAI PORRAAAA”. E na confusão da área, David mete pra dentro! O maracanã explode! E, nessa hora, que eu comecei a ficar tenso. Me bateu um sentimento estranho, comecei a chorar de emoção. Era pouco, mas desciam lágrimas. Gabriel também. Pouco antes do gol eu fiz um vuduzinho no bonequinho azul virando o pé dele. Resolvi começar a destruí-lo. Só que era de um material maleváel, tava difícil quebrar.

Terminou o primeiro tempo. Internacional ganhando, estava levando o título. Entregar dois títulos no mesmo ano pro Internacional não daria pra engolir. Mas a torcida esperava o esporro no time, que entrou sem raça.

E deu resultado. O time voltou muito melhor, a galera se empolgava. Mas a tensão era muito maior e a torcida meio que não conseguia “deslanchar”. Foi num lançamento pra Adriano, bola já meio perdida o zagueiro joga pra escanteio. Pet iria sair pra entrada de Fierro. Quem sabe um gol olímpico?

O Maracanã concentra, reza, atento. Olhei pro cronômetro do meu celular e vi “24:13”. Pensei: essa porra desse 24 vive me perseguindo, é agora que sai o gol. Cruzamento, e Angelim sobe no 15º andar e desvia a bola o suficiente pra estufar a rede. O suficiente para fazer o Maracanã tremer. Chorei que nem criança, todo mundo em volta chorando. A gente sabia que era nosso. Mesmo com toda a tensão, dava pra sentir.

O jogo seguiu tenso, mas sem grandes lances. Até que numa falta esquisita, Bruno espalma a bola e debaixo do gol o jogador do Grêmio perde sozinho. Pensei: “Não tem mais jeito, é sorte de campeão”.

E assim foi. Quando o juiz apitou, o grito foi geral, a festa mais bonita que eu já fiz no Maracanã. Do outro lado, levantaram bandeiras com os rostos de todos os jogadores. Estava lindo, a torcida feliz. Muita gente chorando. Chorando de felicidade.

Esperamos mais ou menos 1 hora para sair e fomos pra pça Varnhagem. Júlio pé-de-pano me liga e nos encontramos com ele. Na Varnhagem, ponto de encontro dos torcedores na Tijuca, os bares estavam mega-hiper-ultra-lotados.

Filipe pareceu, chorando muito ainda. Muito engraçado. Depois também apareceram Fábio Fundo, Cris, Paty, Julia e não lembro direito quem.

Levamos mais de 1h pra arrumar um bar pra beber. Mas conseguimos. E foi demais. O clima era de muita festa. Foi fantástico. Todo mundo feliz. Todos eram um só. Bebemos e cantamos no bar. Só dava a gente. De início, muita gente, mas no fim, só eu, Sereno, Gabriel, Angela e Julio. E lá ficamos, cantando:

“Vamos beber, vamos bebeeeeeeeer

Vamos beber, vamos bebeeeeeeeeer

Vamos beber, vamos bebeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeer

Iiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiihhhhhhhhhhhhhh

Eu vou beber até caiiiiiiiiiiiiiiir

E não adianta levantaaaaaaaaaaaaaaaaarrrrrr

Porque amanhã é feriaaaadddoooooooooooooooo

Eu não preciso trabalhaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaarrrrrrr”

O chopp chegava e já pedíamos outros

“É o chopp, é o chopp, é o chopp, é o chopp” no ritmozinho do funk do Pet.

Bebemos até 1h da manhã e fomos dormir. Tomei um banho de água gelada antes, pois a camisa estava grudada no corpo de tanto suor. Fui dormir, com um imenso sentimento de felicidade.

Os cambistas cobraram pouco.

Gasolina pra abastecer o carro: R$ 20

Flanelinha: R$ 5

Ingresso do sufoco: R$ 125

Ser hexacampeão brasileiro, dentro do Maracanã, no jogo decisivo: não tem preço.

Jamais me esquecerei desse dia. Tive sentimentos que nunca senti na minha vida. Foi sensacional. Mágico.

Márcio Pereira Brito